Balzaquianas contemporâneas chegam à nova fase com o frescor da juventude e nova forma de encarar a vida
25/08/2013 | 00:04 | CAROL BENELLI, ESPECIAL PARA A GAZETA DO POVO
Foi por causa do escritor francês Honoré de Balzac e de seu livro A Mulher de Trinta Anos que, ao chegar à terceira década de vida, elas ficaram conhecidas como “balzaquianas”. O clássico escrito em 1831 traz relatos dos desejos, pensamentos e dilemas das mulheres desta faixa etária, que ainda se fazem atuais.
O que muda de lá pra cá é que a palavra liberdade ganhou mais amplitude, ressoando com mais força nas atitudes femininas. Para a antropóloga da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e escritora Mirian Goldemberg, as novas balzaquianas “se conhecem o suficiente para saber quem são, o que querem e quem querem”. Em seu recém-lançado A Bela Velhice (Ed. Record), a autora define as mulheres de hoje como ageless, ou seja, fazem parte de uma geração sem idade, que desde muito cedo constroem o seu projeto de vida, e isso faz com que possam parecer mais jovens.
Cada mulher tem seu jeito de encarar a virada dos 30 anos. Para a ilustradora maringaense, Cibele Santos, a saída foi enfrentar tudo com bom humor. “Bateu uma crise do tipo ‘minha vida continua uma bagunça’ e, ao invés de chorar e me deprimir, resolvi dar risada e criar a tira Mulher de Trinta.” Foi assim que surgiram os quadrinhos que ilustram a matéria de capa desta edição do Viver Bem.
Entre os diversos perfis de mulheres que passam por essa fase, Mirian Goldemberg detectou no Brasil, por meio de pesquisa de aproximadamente duas mil pessoas, cinco tipos mais comuns: as focadas na carreira e estudo; as hedonistas ou eternas adolescentes; as que se dedicam à família e as que cultuam o corpo em excesso.
Na contramão da busca pela beleza a qualquer preço, estão também aquelas que fizeram as pazes com o tempo e com o espelho. Nem “Amélias” nem operárias, as balzaquianas do século 21 se descobrem, riem de si mesmas e, além de tudo, gostam de si mesmas e não se intimidam em enfrentar novos desafios. Conforme atesta a ilustradora Cibele, “a vida começa a ficar bem interessante aos 30, por isso temos de curtir essa fase da forma mais leve e divertida possível.”
Hora certa
Durante sua adolescência, a analista de sistemas Ellen Vargas, 35, nunca teve instinto maternal muito aflorado e não sonhava em casar e ter filhos. Mas quando estava na faculdade conheceu seu marido, Márcio Vargas, com quem está casada há 11 anos. Já a ideia de não ter filhos se manteve. De lá pra cá, fizeram especialização no exterior, viajaram, se aprofundaram na vida profissional e, no retorno para o Brasil, vieram outras prioridades na qual ter filhos não se encaixava nos planos daquela época.
Os questionamentos sobre a maternidade vieram na virada para os 30 anos. “Meu marido estranhou, porque não tínhamos este projeto de vida. Mas expliquei que não gostaria de me arrepender por não ter filhos, e em princípio, foi uma decisão racional”, lembra Ellen. A decisão foi uma grande surpresa, e o ditado de que quando nasce um bebê, nasce uma mãe se tornou realidade para ela. “Foi a melhor fase para me tornar mãe. Me sinto muito feliz e completa, sem ter a sensação de que estou deixando de viver por conta do meu filho. Fiz tudo o que queria na parte pessoal e profissional.”
Com a chegada do Frederico, hoje com 1 ano, também veio o aumento da cumplicidade e admiração na vida amorosa. “Márcio é muito participativo e vejo que tenho até mais disposição, pois a rotina de um bebê exige mais, mas é muito prazerosa”, conclui.
Planos para a vida a dois
Para a advogada Caroline Ruppel Scarano, 34 anos, a era das balzaquianas tem se mostrado a consolidação de um projeto de parceria e amor. Casada há seis anos, decidiu logo no segundo ano do casamento não ter filhos e trilhou com seu marido, André, um caminho de cuidado mútuo para aproveitar a vida a dois. “A profissão nos exige muito porque viajamos bastante a trabalho. Como nossos pais moram longe, não queríamos filhos para deixar em uma creche tão novinhos, ou serem criados por babás”, opina. Apesar de haver pressão da sociedade e da família, prevaleceu o desejo do bem-estar do casal. “Nossa família estranhou no começo, mas respeitam muito nossa decisão. Até agora somos muito felizes, acho que pode dar certo”, sentencia.
A rotina de ambos, no entanto, teve de mudar depois que, no ano passado, o marido de Caroline teve um AVC. “Hoje, prezamos por um novo estilo de vida, estamos programando viagens de férias, sem esquecer o contato com amigos e família. Também temos um novo companheiro, o gato Michelangelo”, conta Caroline.
A advogada comenta ainda que é um instinto natural das pessoas transferirem o sentimento maternal para um sobrinho, afilhado ou até um animal de estimação. “É uma forma alternativa de compartilhar carinho, mas não se trata de um substituto pra mim ou tenho excesso de cuidados com ele. O gato é só uma boa companhia e o bichinho de estimação da casa”, diz.
Por um final feliz
A empresária Mônica Hancke, 30, celebra a fase balzaquiana e concorda com o jargão popular de que “aos 20 anos se aprende e aos 30 se dá bem na vida”. “Sinto-me mais madura, sei dos meus limites, me reconheço melhor e isso diminui a ansiedade. Vejo que tracei um caminho legal, agora é só caminhar”, comenta.
Boa parte desse percurso foi trilhado no campo profissional. Logo após se formar em Direito, atuou em São José dos Campos e, depois, em São Paulo. A aproximação dos 30 anos foi uma fase de mudanças decisivas para seu retorno a Curitiba, onde mora há dois anos. “Mudei minha atuação com consultoria empresarial voltada para advocacia e resolvi buscar minhas origens para ficar mais próxima da minha família e, quem sabe, criar uma nova.”
Enquanto ainda não encontrou um parceiro para essa fase que se inaugura, cultiva bons momentos com amigos, família, viagens e não abre mão de um bom papo. Não está na ansiedade da busca e curte com leveza esse momento. “Quando surgir alguém, ele vai se aproximar pelo o que acha que poderia viver comigo e acrescentar por estar ao meu lado,” finaliza.
Carteira assinada
Equilíbrio na vida pessoal e profissional desponta como principal fator na mudança de trabalho
Quem nunca fez cerão no trabalho e contou os minutos na ansiedade de voltar para o conforto do lar? Esse cenário é ainda mais comum para a ala feminina na faixa dos 30 anos, em busca do equilíbrio saudável entre vida profissional e pessoal. Para Rosa Krausz, presidente da Associação Brasileira de Coaching Executivo e Empresarial (Abracem), as mulheres de hoje estão demonstrando que ser produtivo não é necessariamente trabalhar até às 23 horas. “Elas querem desmistificar o modelo de ‘viver para trabalhar’ que os últimos 50 anos calcificaram no ambiente profissional”, afirma.
Se a qualidade de vida começa a ser fator determinante para a escolha da carreira das balzaquianas, é natural o crescimento do número de pessoas que mudam de profissão nessa fase, acrescenta Rosa. “Elas começam a vislumbrar alternativas que não tinham no mercado quando iniciaram a vida profissional. E muitas que, até então não pensavam em casamento e filhos, procuram adaptar sua carreira para conciliar uma vida familiar.”
Nessa fase de reflexão, Rosa explica que é comum dar uma pausa na carreira, sem criar um desequilíbrio profissional, pois a atitude é mais aceita hoje pelo mercado. Ela apenas atenta para alguns cuidados antes de tomar a decisão de mudança: “Investigue aspectos positivos e negativos da nova atividade, invista em aprendizado contínuo e fortaleça o networking para abrir novas portas e não arriscar no escuro a nova profissão”.
Agora só falta você
O que as mulheres esperam de um relacionamento quando chegam aos 30
Se aos 20 anos a mulher é muitas vezes escolhida, aos 30 ela é mais sábia, vivida, madura e sabe o que quer, por isso não aceita qualquer parceiro. Sheila Chamecki Rigler, diretora da Agência de Relacionamentos Par Ideal, relata que “a maioria das mulheres que atendemos tem independência pessoal, financeira e familiar. Após se realizar nesses aspectos, procuram uma pessoa com o mesmo nível cultural e social para dividir a vida”.
Dados dos últimos cinco anos da agência de relacionamentos mostram que 89% das mulheres que procuraram a empresa querem ter filhos, enquanto 92% desejam se casar no papel e, somente 3% aceitariam viver juntos sem essa formalização. Entre as maiores qualidades que apreciam no sexo oposto estão: respeito, fidelidade, sinceridade, honestidade, companheirismo, responsabilidade e romantismo. Ao serem perguntadas o que não tolerariam, a maioria respondeu que não querem ao seu lado homens imaturos, mal-educados ou com instabilidade emocional e financeira; e além de tudo não suportam os infiéis.
A crise dos “inta” é muito individual e cada mulher sente isso de forma diferente. No entanto, a virada para os 30 anos é significativa. “Considero o ingresso nesta idade um grande propulsor para encontrar um novo amor, pois 43% das mulheres cadastradas chegam aqui quando completam 30 anos, enquanto que 22% têm 31 anos e apenas 9% têm 29 anos”, ressalta Sheila. Deste universo, 95% são solteiras e nunca foram casadas, apenas 3% são separadas judicialmente. E para quem ainda não achou seu grande amor, a empresária tranquiliza: “Acredito que a vida começa mesmo aos 30 anos, quando as mulheres aproveitaram bem a vida, estão bonitas fisicamente e muitas ainda têm sua beleza ressaltada nesta faixa etária”.