Depois de dominarem o cenário da paquera na década passada, aplicativos de namoro encontram desafios para conquistar público mais jovem.
Na última década, aplicativos de relacionamento como Tinder, Bumble e Grindr provocaram uma revolução comportamental, facilitando, de maneira até então inédita, a conexão dos usuários com um grande número de pessoas e perfis compatíveis.
Mas as qualidades que levaram uma multidão de jovens millenials a deslizar freneticamente a tela de seus celulares para a direita e para a esquerda na busca por um “match” agora estão sendo vistas de outra forma pela Geração Z.
Contexto… Millenials são os nascidos de 1980 a 1995; Geração Z são os nascidos entre 1997 e 2012.
Segundo uma pesquisa realizada em 2023 pela empresa de inteligência de mercado Savanta, 9 em cada 10 jovens da Geração Z passam por uma espécie de burnout da paquera e fogem dos apps. Os motivos citados para descrever a aversão à experiência de flertar digitalmente são, principalmente:
- frustração;
- mesmice;
- insegurança;
- e superficialidade.
O profissional de marketing Vinícius Cardoso, de 27 anos, é um desses que decidiu interromper a busca por lances casuais ou mesmo relações mais significativas nos aplicativos. O jovem, que tinha contas em plataformas de namoro havia quase uma década, desinstalou todas de seu celular.
“Em apps de ‘pegação’, tenho a sensação de que é muito difícil conseguir algo rápido, mas que não seja um absurdo; em apps de ‘match’, sinto que a conversa nunca vai para frente, exige muita energia para um resultado baixíssimo”, afirma.
Para a jornalista Diana Cheng, de 27 anos, os aplicativos até ajudam a iniciar conversas, mas expectativas pessoais e “réguas” de aprovação quase sempre terminam em frustrações — o que desmotiva o início de novas conversas.
“Não tenho usado o aplicativo há algum tempo porque, de alguma maneira, eu já sabia que iniciar novas conversas seria como refazer todo o processo de marcar um encontro e gerar novas frustrações”, diz a jovem.
‘Ghosting’ da Gen Z virou assunto de investidores
O “burnout da paquera” online virou assunto em mesas de bar, sessões de terapia e até de investidores preocupados com o desempenho dessas plataformas de relacionamento na Nasdaq, a bolsa de valores dos Estados Unidos que reúne as maiores empresas de tecnologia do mundo.
De 2021 para cá, as ações da Match Group — a empresa-mãe que controla aplicativos como Tinder, OkCupid e Hinge — e do Bumble tombaram cerca de 75% e 90%, respectivamente. O momento turbulento no mercado financeiro vem exigindo das empresas mudanças na operação e governança:
O Match Group anunciou que demitirá 6% do seu quadro de funcionários, em meio a sete semestres consecutivos de declínio no número de usuários pagos.
Depois de 10 anos no comando do Bumble, Whitney Wolfe Herd cedeu o posto de CEO à brasileira Lidiane Jones no fim de 2023. Em entrevista ao “Wall Street Journal”, Jones assumiu o compromisso de aumentar o investimento da companhia em inteligência artificial, como parte da sua estratégia de retomada do crescimento.
Além da alta dos juros no período, que aumentam o custo da operação das empresas, e pressões inflacionárias, que obrigam os consumidores a cortarem gastos não essenciais, analistas financeiros consultados pelo Yahoo Finance entendem que a baixa das ações está atrelada à limitada perspectiva de crescimento em demografias mais jovens.
“Esses apps foram desenhados por millenials para millenials e navegar por uma transformação geracional tem se provado um caminho traiçoeiro. Isso porque os usuários mais jovens estão optando mais pelo cara a cara e dependendo menos dos aplicativos para encontrar novos parceiros”, disse o analista Andrew Morok, do banco de investimentos Raymond James, ao Yahoo Finance.
Por outro lado, Morok pontuou que aplicativos voltados a recortes específicos conseguiram reter com mais eficiência o engajamento dos usuários, o que se traduz em melhores resultados financeiros e uma reação mais positiva dos investidores.
É o caso do Grindr, voltado ao público gay, que viu as ações dispararem mais de 56% em 2024 — valorização bem superior aos concorrentes.
Downloads em baixa no Brasil
Em levantamento solicitado pelo g1, a empresa norte-americana de inteligência de mercado Sensor Tower revela mais detalhes do cenário digital para o Tinder e para o Bumble no contexto brasileiro.
Em geral, os números destacam tendência de queda nos downloads e sinais mistos sobre a quantidade de usuários ativos na janela pós-pandêmica (de 2022 até hoje):
Usuários ativos mensais do Tinder no Brasil caíram 8% no terceiro trimestre de 2024 (números acumulados até o início de setembro), examinando a comparação anual; já os números do Bumble subiram 24% no mesmo período, mas sob uma base de usuários dez vezes menor.
Downloads do Tinder caíram de 7 milhões para 4 milhões entre 2022 e 2024, queda de 42%; no mesmo intervalo, o Bumble chegou a 4 milhões em 2023, mas voltou aos 2 milhões neste ano.
Correndo atrás
Quando os aplicativos de relacionamento não satisfazem a procura por encontros, a alternativa escolhida por muitos jovens adultos, agora, é voltar à clássica “paquera presencial”, recorrendo a abordagens e desfechos distintos.
“Sair com a roda de amigos dos seus amigos pode render bons encontros. O mais legal é que, como não é algo que você costuma criar expectativa em cima, não existe a pressão do ‘date perfeito'”, diz Diana.
“Eu me descobri muito bom em fazer abordagens e flertar na rua com desconhecidos. Não rendeu grandes dates, mas foram situações divertidas e inusitadas”, acrescenta Vinícius, aos risos.
Mas os aplicativos não passam inertes aos novos (ou seriam velhos?) hábitos de flerte e vem promoverndo novas funcionalidades para recompor as necessidades e singularidades da Geração Z.
Entre as novas funções implementadas pelo Tinder e citadas ao g1 por José Diogo Costódio Rodrigues, diretor de marketing da companhia, está a implementação de um espaço onde os usuários podem se conhecer melhor, valendo-se do estilo cara a cara:
O Tinder Date Club trouxe a nossa marca para espaços físicos ao longo do ano, criando experiências imersivas de encontros e conexões em locais como o Janela Bar pelo Brasil, o Jo&Joe no Rio de Janeiro, e a festa de música eletrônica GOP TUN. Essas ativações permitiram que os usuários estendessem suas conexões no aplicativo para ambientes da vida real, mesclando as interações físicas e digitais.
Além da criação de selos de intenção de namoro, que podem aumentar a compatibilidade de objetivos entre os usuários, o Bumble aposta em funcionalidades para ajudar o público jovem a encontrar novas amizades.
Para a Gen Z, construir amizades significativas é tão importante quanto relacionamentos românticos. Por isso que o Bumble For Friends se tornou uma opção cada vez mais popular para aqueles que buscam conexões autênticas além do namoro, permitindo que os usuários explorem diferentes tipos de relacionamentos sem pressão”, diz Paulina Aguirre, gerente sênior do Bumble Brasil.
Fonte: g1.globo.com